Jovem de 16 anos sofreu estupro coletivo esta semana | Foto:Reprodução/Twitter
Os atendimentos a mulheres vítimas de violência sexual, física ou
psicológica em unidades do Sistema Único de Saúde (SUS) somam, por ano,
147.691 registros - 405 por dia, ou um a cada quatro minutos. A maior
procura por serviços de saúde após casos de agressão se dá entre
adolescentes de 12 a 17 anos, faixa etária das duas vítimas de estupro
que ganharam repercussão na semana passada, no Rio e no Piauí.
Especialistas apontam para a necessidade de se encerrar a "lógica
justificadora" que tenta lançar para as vítimas a culpa pelos crimes. Os
dados integram o Mapa da Violência - Homicídio de Mulheres, um dos mais
respeitados anuários de violência do País. As estatísticas foram
reunidas com base no Sistema de Informação de Agravos de Notificação
(Sinan), do Ministério da Saúde, que registra os atendimentos na rede do
SUS. O relatório mostra que Mato Grosso do Sul, Acre, Roraima,
Tocantins e Minas lideram a lista de Estados com as maiores taxas de
procura por atendimento. O registro mais recente do Sinan contém dados
de 2014 - o estudo foi concluído no fim de 2015. O cônjuge da vítima
aparece como o agressor mais frequente, responsável por 22,5% das
ocorrências; outras pessoas próximas de adolescentes e mulheres também
são apontadas como responsáveis por ataques, como namorado, ex-namorado,
irmão, pai e padrasto. Em só 13% dos casos, a agressão é cometida por
uma pessoa desconhecida. No caso do Rio, um dos suspeitos é ex-namorado
da vítima de 16 anos que diz ter sido atacada por mais de 30 homens no
Morro da Barão. "A normalidade da violência contra a mulher no horizonte
cultural do patriarcalismo justifica, e mesmo 'autoriza', que o homem
pratique essa violência, com a finalidade de punir e corrigir
comportamentos femininos que transgridem o papel esperado de mãe, esposa
e dona de casa", aponta o Mapa da Violência - Homicídio de Mulheres.
"Culpa-se a vítima pela agressão, seja por não cumprir o papel doméstico
que lhe foi atribuído, seja por 'provocar' a agressão dos homens nas
ruas ou nos meios de transporte, por exibir seu corpo."
A secretária nacional de Direitos Humanos | Foto: Divulgação / OAB-SP
Ao Estado, Julio Jacobo Waiselfisz, coordenador da pesquisa e da área de
estudos sobre violência da Faculdade Latino-Americana de Ciências
Sociais (Flacso), reforça a tese e diz ver uma reação conservadora à
tentativa de ampliação de direitos pelas mulheres. "Na medida em que se
criam condições sociais de proteção, mais violento se torna o agressor. É
uma reação conservadora do patriarcalismo machista que persiste no
Brasil", diz Waiselfisz. "E, hoje, estamos assistindo a uma cultura em
que está permitindo esse tipo de violência." Os dados do Mapa da
Violência mostram também que são as mulheres jovens as que mais voltam
para novos atendimentos no SUS após outros casos de violência. "A
violência contra a mulher é mais sistemática e repetitiva do que a que
acontece contra os homens. Esse nível de recorrência da violência
deveria ter gerado mecanismos de prevenção, o que não parece ter
acontecido", diz Waiselfisz. Para a secretária nacional de Direitos
Humanos, Flávia Piovesan, "é fundamental trabalhar em educação e
capacitação dos operadores da segurança pública e da Justiça para que
entendam que a violência contra a mulher é gravíssima violação contra os
direitos humanos". Ao Estado, ela afirmou também que são necessárias
três linhas de enfrentamento do problema. "Precisamos adotar medidas
eficazes no que se refere ao dever do Estado de investigar, processar e
punir essas violações sob a perspectiva de gênero; adotar todas as
medidas para dar total e integral apoio e assistência às vítimas; e
adotar medidas preventivas, fomentando educação com parâmetros não
sexistas e igualitários. Isso é o mais difícil", diz Flávia. Para a
promotora paulista especialista em combate à violência doméstica Silvia
Chakian, a solução passa pelo combate à impunidade dos agressores, mas
também exige medidas educativas.
Bahianotícias
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